[Artigo atualizado em 18/09/2023]
Como nutricionista independente formada pelo G.R.O.S. (Groupe de Réflexion sur l’Obésité et le Surpoids), partilho hoje convosco um extrato de uma consulta que teve lugar no meu consultório. A paciente (“P”) contactou-me por telefone e disse-me que tinha excesso de peso. Eu (“T” de terapeuta) encontrei-me com ela pela primeira vez.
Desenrolar da consulta
– P: “Olá, gostaria de perder cerca de dez quilos. Já experimentei comer uma maçã por dia, fiz dietas ****, cortei no açúcar e na gordura, comi comida cozinhada a vapor, …. Por vezes funciona, mas normalmente passado algum tempo volto a engordar tudo e mais alguma coisa. Desta vez, quero que dure e por isso comprei uma balança, estou disposta a pesar tudo, a ser mais rigorosa, vou manter-me firme e não vou ceder, vou seguir os seus conselhos à risca, diga-me o que devo fazer.
– T – Não há dúvida, tem uma vontade férrea e a sua motivação não precisa de mais provas. Mas tens a certeza de que o método é o mais adequado para ti? Tu própria dizes que, passado algum tempo, voltas aos teus velhos hábitos e estás agora com mais peso do que quando começaste, sem nunca teres deixado de querer perder peso…
– P: Concordo, mas como é que se faz?
– T: O que é que acha que a impede de perder peso a longo prazo?
– P: O açúcar! Sou viciada nele! É-me impossível passar sem ele…
– T: Então, o que acha de começar por trabalhar as quantidades de outros alimentos, aqueles que não são doces? Comendo-os em menor quantidade, o seu peso começará a baixar.
– P: Bem, isso não pode resultar, é o açúcar que engorda!
– T: O que é que achas que engorda mais: 100 calorias de açúcar ou 100 calorias de brócolos?
– P: É óbvio que 100 calorias de açúcar fazem-me engordar. O açúcar é armazenado e não faz o mesmo efeito no corpo que os brócolos.
– T: Consegue imaginar que o que faz engordar é ultrapassar o número de calorias de que necessita todos os dias, independentemente da fonte de ingestão?
– P: É difícil, não nos ensinam isso.
– T: O que aprendeste até agora ajudou-te a perder peso?
– P: Não, como disse há pouco, engordei…
– T: Então, é possível tentar ver as coisas de outra maneira?
– P: Sim, posso tentar.
– T: Concordas que um quilo de penas e um quilo de chumbo pesam um quilo?
– P: Concordo!
– T: Então 100 calorias de açúcar e 100 calorias de brócolos trazem 100 calorias para o corpo e têm o mesmo efeito no peso?
– P: Sim …
– T: Se as minhas necessidades energéticas são de 2000 calorias por dia, quando como 1000 calorias por dia de pastelaria vienense, perco peso, e quando como 3000 calorias de feijão verde, ganho peso …
– P: Visto assim ….
– T: Muitas vezes, o que impede os pacientes que vejo de perder peso é pensar que há alimentos bons e maus. Comem mais do que o necessário dos alimentos ditos “bons” e sentem-se culpados quando comem os “maus”. Mas isso não os impede de deixar de comer os alimentos “maus”, e eu diria mesmo que, depois de começarem, comem mais do que precisam.
– P: Identifico-me com o que está a dizer!
– T: Se hoje tem excesso de peso, é porque, por vezes, deu ao seu corpo mais calorias do que as necessárias. Vamos então reajustar gradualmente a sua alimentação às suas necessidades. Para isso, pode começar por reduzir as porções dos alimentos que lhe são mais fáceis de eliminar. O que é que acha?
– P: Nesse caso, não vou comer mais legumes e só vou comer bolachas. Não se pode perder peso se não se fizer uma dieta equilibrada, pois não? Além disso, vou ter carências …
– T: Na sua opinião, depois de meses de pequenos-almoços, almoços e jantares compostos por doces, pastelaria e bolachas de chocolate, vai querer uma bandeja de mignardises ou um prato variado e diversificado?
– P: Vou ter nojo dos doces de que tanto gosto. Então é esse o segredo? Ter nojo de mim próprio para não me sentir tentado?
– T: Consegue imaginar que, em vez disso, se permite comê-los, que tem prazer em fazê-lo, que sente uma verdadeira satisfação depois de os provar, que já não tem medo das consequências para o seu peso, que pode regular as quantidades naturalmente, sem se limitar e sem se colocar sistematicamente numa posição de fracasso?
– P: Está a falar de fazer as pazes com o açúcar em vez de continuar a lutar contra ele, é isso? Achas mesmo que isso me vai ajudar a perder peso?
– T: Estou convencido disso, e tu?
– P: Mas tenho de parar quando é preciso! Mas como é que eu sei quais são as minhas necessidades? E como é que as posso respeitar?
– T: Na sua opinião, como é que sabe se precisa de comer?
– P: O meu estômago, a fome!
– T: Sem dúvida!
– P: Mas é muito difícil parar de comer quando já não se tem fome. Eu sou muito gulosa, sabes! Sobretudo quando os outros à minha volta ainda estão a comer, ou quando sei que ainda há bolo…
– T: Achas que o facto de te proibires de comer sempre vai resolver o problema?
– P: Quando não estou com vontade, é impossível. Mas sei que não devo petiscar. É nessas alturas que tenho mais vontade de comer açúcar.
– T: Nesses momentos, o açúcar fá-la sentir-se melhor?
– P: Na altura, sim, mas depois sinto-me culpada. Por isso, prometo a mim próprio que não volto a fazê-lo.
– T: E isso resulta?
– P: Nem por isso, é um círculo vicioso…
– T: Imagina então que quanto menos se satisfazem estes desejos, mais eles voltam?
– P: Sim, mas satisfazê-los é perigoso…
– T: No início, sim, mudar um hábito não é assim tão simples. É preciso tempo. É essa a tua prioridade agora?
– P: Sim, sem dúvida!
– T: Achas que és capaz de o fazer?
– P: Sim, acho que sim… “